domingo, 4 de janeiro de 2009

Enunciado e correcção do teste do 9ºB (Dezembro)

Grupo I
Texto A
Na clareira, em frente à moita que encobria o tesouro (e que os três tinham desbastado a cutiladas) um fio de água brotando entre rochas caía sobre uma vasta laje escavada, onde fazia como um tanque, claro e quieto, antes de se escoar para as relvas altas. E ao lado, na sombra de uma faia, jazia um velho pilar de granito, tombado e musgoso. Ali vieram sentar-se Rui e Rostabal, com os seus tremendos espadões entre os joelhos. As duas éguas retouçavam a boa erva pintalgada de papoulas e botões-de-ouro. Pela ramaria andava um melro a assobiar. Um cheiro errante de violetas adoçava o ar luminoso. E Rostabal, olhando o Sol, bocejava com fome.
Então Rui, que tirara o sombrero e lhe cofiava as velhas plumas roxas, começou a considerar, na sua fala avisada e mansa, que Guanes, nessa manhã, não quisera descer com eles à mata de Roquelanes. E assim era a sorte ruim! Pois que se Guanes tivesse quedado em Medranhos, só eles dois teriam descoberto o cofre, e só entre eles dois se dividiria o ouro! Grande pena! Tanto mais que a parte de Guanes seria em breve dissipada, com rufiões, aos dados, pelas tavernas.
 Ah! Rostabal, Rostabal! Se Guanes, passando aqui sozinho, tivesse achado este ouro, não dividia connosco, Rostabal!
O outro rosnou surdamente e com furor, dando um puxão às barbas negras:
 Não, mil raios! Guanes é sôfrego… Quando o ano passado, se te lembras, ganhou os cem ducados ao espadeiro de Fresno, nem me quis emprestar três para eu comprar um gibão novo!
 Vês tu?  gritou Rui, resplandecendo.
Ambos se tinham erguido do pilar de granito, como levados pela mesma ideia, que os deslumbrava. E, através das suas largas passadas, as ervas altas silvavam.
 E para quê?  prosseguia Rui.  Para que lhe serve todo o ouro que nos leva? Tu não o ouves, de noite, como tosse? Ao redor da palha em que dorme, todo o chão está negro do sangue que escarra! Não dura até às outras neves, Rostabal! Mas até lá terá dissipado os bons dobrões que deviam ser nossos, para levantarmos a nossa cara, e para tu teres ginetes, e armas, e trajes nobres, e o teu berço de solarengos, como compete a quem é, como tu, o mais velho dos de Medranhos…
 Pois que morra, e morra hoje! – bradou Rostabal.
 Queres?
Vivamente, Rui agarrara o braço do irmão e apontava para a vereda de olmos, por onde Guanes partira cantando:
 Logo adiante, ao fim do trilho, há um sítio bom, nos silvados. E hás-de ser tu, Rostabal, que és o mais forte e o mais destro. Um golpe de ponta pelas costas. E é justiça de Deus que sejas tu, que muitas vezes, nas tavernas, sem pudor, Guanes te tratava de “cerdo” e “torpe”, por não saberes a letra nem os números.
 Malvado!

Eça de Queirós, “O Tesouro”


Vocabulário
cutiladas – golpes de cutelo (instrumento cortante); quedar – ficar quedo; parar;
ducado – moeda de ouro: faia – pequena árvore;
gibão – casaco curto; retouçar – pastar;
cofiar – alisar com a mão (a barba ou o cabelo); ginetes – cavalos pequenos, de boa raça.



1. Recorrendo ao conhecimento que tens da obra, refere a situação inicial do conto.

1.1. Indica o acontecimento que alterou a rotina dos três irmãos.

2. Ao contrário da situação que nos é apresentada no início do conto, agora, no presente excerto, os protagonistas são apenas dois. Identifica-os.

2.1. Recordando a obra na íntegra, aponta os motivos que levaram à ausência do outro irmão.

3. No presente excerto, os dois irmãos falam sobre o irmão ausente. Como o caracterizam?

3.1. “Ambos se tinham erguido do pilar de granito, como levados pela mesma ideia, que os deslumbrava.” Qual a ideia a que se refere o texto? Justifica.

4. A partir dos elementos que este texto apresenta, traça o retrato psicológico das duas personagens nele presentes.

5. No parágrafo inicial do excerto predomina a descrição. Justifica esta afirmação.

5.1. Refere dois recursos estilísticos nele presentes e demonstra a sua expressividade.

6. Explica o uso do verbo e do advérbio, destacando a sua expressividade, no exemplo seguinte:
a) “O outro rosnou surdamente e com furor..”;

7. Explica o sentido das expressões:
a) “..na sua fala avisada e mansa...”
b) “Não dura até às outras neves, Rostabal!”
c) “...por não saberes as letras nem os números.”

8. O discurso indirecto livre é uma marca do discurso queirosiano. Transcreve marcas do seu uso.


Texto B
Proposição
As armas e os barões assinalados
Que, da Ocidental praia Lusitana,
Por mares nunca dantes navegados,
Passaram ainda além da Taprobana,
Em perigos e guerras esforçados
Mais do que prometia a força humana,
E entre gente remota edificaram,
Novo reino, que tanto sublimaram;

E também as memórias gloriosas
Daqueles reis que foram dilatando
A Fé, o Império, e as terras viciosas
De África e de Ásia andaram devastando;
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando:
- Cantando espalharei por toda a parte,
Se a tanto me ajudar o engenho e a arte.

Cessem do sábio Grego e do Troiano
As navegações grandes que fizeram;
Cale-se de Alexandro e de Trajano
A fama das vitórias que tiveram;
Que eu canto o peito ilustre Lusitano
A quem Neptuno e Marte obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa antiga canta,
Que outro valor mais alto se alevanta.

Luís de Camões, Os Lusíadas

1. Lê atentamente o texto acima transcrito.
1.1. Quando alguém deseja empreender uma viagem, ou tomar uma decisão importante, costuma começar pela definição de um plano organizador em que define (explicitamente ou não) aquilo que se propõe fazer.
A definição nos dicionários é a seguinte:

Proposição, s. f. acto ou efeito de propor; expressão do juízo; enunciado verbal susceptível de ser declarado verdadeiro ou não; oração gramatical; primeira parte de um discurso ou de um poema onde se expõe o assunto que se vai tratar.
Dicionário de Língua Portuguesa, Porto Editora

1.1.1. Com o objectivo de redigires um texto cuidado, atenta nas sugestões que seguidamente te são dadas, sob a forma de perguntas:

a) Qual dos significados apresentados te parece mais ajustado ao Texto C?
b) Por que razão as epopeias clássicas se iniciam com uma “proposição”?
c) Que se pretende afinal, com uma “proposição”?
d) No caso de Os Lusíadas, Camões terá respeitado esse “costume” clássico. Em que medida o conseguiu? Justifica a tua opinião.

Extensão: de 80 a 100 palavras



Grupo II

1. Divide e classifica as orações nas frases:

a) “...até lá terá dissipado os bons dobrões que deviam ser nossos...”;
b) “Se Guanes (...) tivesse achado este ouro, não dividia connosco, Rostabal!”

c) “Rui (…) começou a considerar (…) que Guanes, nessa manhã, não quisera descer com eles à mata de Roquelanes.”

2. Passa para o discurso indirecto o seguinte excerto:

“ Não, mil raios! Guanes é sôfrego… Quando o ano passado, se te lembras, ganhou os cem ducados ao espadeiro de Fresno, nem me quis emprestar três para eu comprar um gibão novo!”

3. Identifica a função sintáctica desempenhada pelas expressões sublinhadas:
a)”E ao lado, na sombra de uma faia, jazia um velho pilar de granito, tombado e musgoso.
b) “Se Guanes, passando aqui sozinho, tivesse achado este ouro, não dividia connosco, Rostabal!”

Grupo III

Escolhe uma das opções seguintes:

Tema A
Num texto cuidado, redige a continuação da narrativa a partir da frase final da obra: “E o tesouro ainda lá está, na mata de Roquelanes.”

Tema B
Pensas que o dinheiro modifica o carácter e o comportamento das pessoas? Escreve um texto de opinião, em que defendas os teus pontos de vista sobre este assunto.

Extensão: de 180 a 280 palavras

Bom trabalho!
A professora: Aurora Gomes
Nov/08


CORRECÇÃO
I
Texto A
1. A situação inicial do conto remete o leitor para a existência miserável dos três irmão de Medranhos, fidalgos arruinados do reino das Astúrias.

1.1. O acontecimento que alterou a rotina dos três irmãos foi a descoberta casual de um tesouro quando andavam na mata de Roquelanes à procura de caça e de cogumelos.

2. No excerto, os protagonistas são Rui e Rostabal.

2.1. Os motivos que levaram à ausência do outro irmão foram o facto de Guanes ser o mais leve dos três e, por esse motivo, ter sido incumbido por Rui de ir buscar, à vila de Retortilho, mantimentos para eles e para os animais e bolsas para carregar o tesouro.

3. Os dois irmãos caracterizam Guanes como sendo egoísta, jogador inveterado e perdulário; além disso, segundo Rui, ele estaria gravemente doente e teria pouco tempo de vida.

3.1. “Ambos se tinham erguido do pilar de granito, como levados pela mesma ideia, que os deslumbrava.” A frase do texto remete para a ideia de assassinar Guanes que surge como óbvia após a conversa entre Rui e Rostabal. Contudo, embora pareça que a ideia é de ambos, foi Rui quem convenceu Rostabal a desejar a morte do irmão.

4. Rui demonstra ser inteligente, persuasivo, manipulador, egoísta e violento; Rostabal parece ser pouco perspicaz, influenciável, algo ingénuo e violento.

5. No parágrafo inicial do excerto predomina a descrição porque este corresponde a um momento de pausa na acção dado que se estão a dar informações sobre o espaço em que os dois irmãos estão. Assim, predomina o uso de recursos expressivos, de adjectivos e nomes e formas verbais no pretérito imperfeito – “ (...) um fio de água brotando entre rochas caía sobre uma vasta laje escavada, onde fazia como um tanque, claro e quieto (...)” (adjectivação e comparação; nomes, adjectivos e formas verbais no imperfeito sublinhados).

6. “ (...) velho pilar de granito, tombado e musgoso.” – neste exemplo está presente a adjectivação múltipla que nos dá a ideia de uma natureza onde desde há muito não se sentia a presença humana; “Pela ramaria andava um melro a assobiar.” – aqui temos uma metáfora que nos remete para uma característica particular do canto dos melros; “Um cheiro errante de violetas adoçava o ar luminoso.” – neste exemplo aparece a sinestesia que evidencia a a beleza harmoniosa do local.

7. No exemplo dado, o uso combinando do verbo rosnar e do advébio surdamente indica que Rostabal falou em tom baixo mas violento.

8. A expressão “..na sua fala avisada e mansa...” indica que Rui estava a ser persuasivo, falando de modo calmo de modo a melhor convencer Rostabal.
Com “Não dura até às outras neves, Rostabal!” Rui pretendia dizer que Guanes tinha pouco mais de seis meses de vida.
A expressão “...por não saberes as letras nem os números.” indica-nos que Rostabal era analfabeto.

9. “E assim era a sorte ruim! Pois que se Guanes tivesse quedado em Medranhos, só eles dois teriam descoberto o cofre, e só entre eles dois se dividiria o ouro! Grande pena!”


Texto B
1.1.1.
A proposição é uma das partes obrigatórias da estrutura interna de uma epopeia que tem a função de apresentar o objectivo da obra.
N’Os Lusíadas, Camões respeita essa regra, desvendando o seu objectivo – elogiar, em verso, os feitos gloriosos do povo português. Para isso, ele apresenta o assunto e os heróis a tratar: os feitos dos navegadores e guerreiros, as façanhas dos reis e os heróis individuais que, pelas suas acções, se tornaram imortais.
Na proposição apresenta-se, assim, o valor do “peito ilustre Lusitano” que fará esquecer todos os heróis da Antiguidade. (92 palavras)
II
1. Divide e classifica as orações nas frases:
a) Oração subordinante: “...até lá terá dissipado os bons dobrões...”;
Oração subordinada relativa restritiva: “... que deviam ser nossos...”.
d) Oração subordinante: “... não dividia connosco, Rostabal!”;
Oração subordinada condicional: “Se Guanes (...) tivesse achado este ouro...”.

c) Oração subordinante: “Rui (…) começou a considerar (…);
Oração subordinada completiva: “... que Guanes, nessa manhã, não quisera descer com eles à mata de
Roquelanes.”

2. Rostabal exclamou, praguejando, que Guanes era sôfrego e lembrou Rui que, quando no ano anterior ganhara (OU tinha ganhado) cem ducados ao espadeiro de Fresno, nem lhe quisera (OU tinha querido) emprestar três para ele comprar um gibão novo.

3. a)”E ao lado, na sombra de uma faia, jazia um velho pilar de granito, tombado e musgoso. – os adjectivos desempenha, a função sintáctica de atributo.
b) “Se Guanes, passando aqui sozinho, tivesse achado este ouro, não dividia connosco, Rostabal!” – as expressões sublihadas desempenham, respectivamente, as funções sintácticas de complemento directo e de vocativo.

Grupo III


Tema A
Obedecer ao tema (respeitando as informações do texto original e não criando situações incoerentes) e ao tipo de texto propostos, apresentando um texto com introdução, desenvolvimento e conclusão, respeitando as características do texto narrativo, demarcando claramente os parágrafos, usando a terceira pessoa do singular, vocabulário adequado ao tema, apresentando clareza e correcção sintáctica e ortográfica e respeitando o limite de palavras.

Tema B
Obedecer ao tema e ao tipo de texto propostos, apresentando um texto com introdução, desenvolvimento e conclusão, demarcando claramente os parágrafos, usando a primeira pessoa, vocabulário adequado ao tema e expressões que denotem opinião (exs.: “na minha opinião...”; “penso que...”; “acho que...”; “considero que...”; “a meu ver...”; “do meu ponto de vista...”), apresentando clareza e correcção sintáctica e ortográfica e respeitando o limite de palavras.

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